segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

A arte de olhar com outros olhos

Nunca trocaram sequer um olhar. A menina que não sabia desenhar rabiscava os olhos dele nas paredes de seu quarto. O garoto do coração de leão sonhava com as montanhas que escondiam os seus fantasmas; porém não possuía olhos. Sonhava com a perda da visão que não lhe aguçou os demais sentidos, entretanto lhe fez um valente por natureza.

A menina não sabia que tipo de sonhos sonhar e prometia aos céus que não iria correr, que não iria cair. Nas penumbras da madrugada rabiscava com carvão em uma parede preta; ela nunca encontrou os seus olhos; ele nunca conseguiu fazê-la sonhar.

Na abstinência das cores nos olhos daltônicos da menina, o garoto encontrou seu sorriso; na falta de visão nas órbitas vazias dele, a menina encontrou seus sonhos desenhados em todas as cores existentes. Ele não sabia de suas expressões, ela nunca poderia dizer qual era sua cor preferida. Não se entristeciam; completavam-se em suas imperfeições. O coração-de-leão lhe protegia das aborreções de ser bonita; ela lhe protegia dos medos de ser o único a nunca ver o azul do mar.

Nunca trocaram sequer um olhar. Mas se enxergavam todos os dias.

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